sexta-feira, 25 de março de 2016

Lavras : O início de uma grande história......



Foto: Coletânia Renato Libeck



Alessandra Teixeira da Silva (*)
Engª Florestal
Membro da Academia Lavrense de Letras

O município de Lavras, MG, situado no Sul de Minas Gerais, foi fundado em 1729 (data presumível), transformado em município em 13 de outubro de 1831, desenvolvendo-se em torno da capela de Santana, hoje igreja do Rosário.  Em 20 de julho de 1868, obteve a emancipação política e administrativa e em 8 de outubro do mesmo ano foi transformada em comarca.
Segundo relatos de Firmino Costa, grande educador que residiu em Lavras, o nome de "Lavras do Funil" deve-se ao fato de ter existido aqui, grandes quantidades de ouro e pedras preciosas. O nome de "Lavras" vem de lavrar em busca do metal precioso, o que, segundo ele, foi a principal causa do desenvolvimento de Lavras. Quanto ao Funil, é devido ao fato de existir um estrangulamento no rio Grande, onde foi construída uma ponte, a ponte do Funil, que hoje está submersa nas águas do reservatório da usina hidrelétrica do Funil.
Os primeiros povoadores foram os paulistas Pedro da Silva Miranda, Francisco Bueno da Fonseca e seu filho Diogo Bueno da Fonseca, Salvador Jorge Bueno e Pascoal Leite Paes. Esses, percebendo a necessidade de edificar no povoado uma capela com a invocação de Sant’Anna, pediram licença ao arcebispo de Mariana, Frei Manuel da Cruz. Essa licença foi concedida em 18 de setembro de 1751 e a inauguração da capela ocorreu no ano de 1754, semiterminada e benta pelo padre Manuel Martins, tendo sido concluída em 1810, pela Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos. Em 1904, com a construção de uma nova matriz de Sant’Anna, a velha matriz passou  a  denominar-se Igreja de Nossa Senhora do Rosário.
            Além de inúmeros anônimos que ajudaram a edificar essa igreja, segundo consta, artistas de renome, como o mestre Ataíde e o Aleijadinho, deram suas contribuições para ornamentá-la: o primeiro na pintura do teto e o segundo com trabalhos em entalhe e pedra.
Segundo a visão do Dr. Samuel Rhea Gammon, o município de Lavras era, no ano de 1892, uma velha cidade, datando dos dias coloniais e, como o seu nome indica, tinha sido cenário de grande mineração, na busca do ouro que enriquecia a coroa de Portugal. Pode-se dizer que só havia uma rua, que se estendia em ziguezague pela colina, com cerca de quatro quilômetros de extensão, terminando no Alto do Cruzeiro. As ruas eram poeirentas ou lamacentas e ainda rasgadas pelas rodas dos pesados carros de boi.
As casas, em geral, eram de construção simples, mas sempre pintadas de cores variegadas. Na praça central, grande e deserta, onde se erguia a Igreja Matriz, havia certo número de sobrados, onde vivia a elite. Essas casas, em estilo colonial, eram bem mobiliadas e adornadas com pinturas e revestimento caprichoso, refletindo o luxo e a riqueza de dias prósperos. Nos arredores da cidade, porém, se amontoavam os casebres cobertos de capim, atestando a maior pobreza. Eram assim as cidades antigas do interior de Minas. Hoje, as ruas foram endireitadas, pavimentadas e dotadas de passeios. As praças se transformaram em parques e jardins.
Lavras começou a crescer com o declínio da exploração aurífera na região da faixa de terra entre os rios Grandes, Capivari e Mortes, quando se iniciou o processo de migração para o arraial, com a vinda das famílias de Antônio de Souza, em 1743; do capitão Luis de Almeida Silva; de Brás da Silva Lopes, em 1744; João Álvares de Paiva, em 1746; João de Campos, em 1747; José da Silva, Manoel Gonçalves Pereira, em 1748. Mais tarde, outras famílias apareceram para gravar seus nomes nos pilares do progresso de Lavras. Assim vieram; Silva Leme, Ferreira, Almeida Pedroso, Lopes Vieira, Gomes Salgado, Faria Neves, Ferreira de Araújo, Costa Valle, Silva, Paiva, Claro, Bastos, Prado, Morais, Carvalho, Pires, Gonçalves, Vieira, Souza, Marques, Moinho, Branco e outras.
O jornal carioca Imprensa Industrial publicou em 25/06/1877 uma curiosa matéria sob o título “Justiça de capitães mores”, onde narra um fato passado em nossa cidade, mais precisamente na Praça Municipal.
“Há em Lavras, na província de Minas, uma praça de grandes dimensões, hoje toda arborizada e gramada, a qual se liga uma curiosa história passada não há muitos anos e que comprova até que ponto subia a autoridade despótica dos nossos antigos capitães mores.
Alguns moradores do lugar, entendendo que podiam a seu bel-prazer diminuir às dimensões da praça, traçaram dentro dela uma rua e começaram a edificar casas sem outra licença que não fosse a de suas vontades.
Com razão representaram dois capitães mores a fazendeiros das circunvizinhanças à Câmara Municipal de São João Del Rey contra o esbulho do logradouro público, a Câmara, porém, pensando de modo diverso dos representantes, achou que os esbulhadores faziam bem em edificar na praça pública. Vendo-se por tal modo desatendidos, os dois ponteados, levados mais pelo desejo da desafronta que pela manutenção do direito, resolveram arrasar às casas em construção, anunciando previamente, por bandos, que em tal dia executariam a sentença que em seus tribunais de mandões havia decretado.
Correram os edificadores a um terceiro capitão mor, um certo Januário Garcia, conhecido mais tarde pela denominação de “Sete Orelhas”, implorando-lhe o valimento e proteção. Januário Garcia, tomando uma pena, escreveu a um dos que ameaçavam derrubar às casas dos invasores, o seguinte bilhete:
“Primo, amigo e senhor. Constando-me que V. Mercê quer arrancar às casas construídas na praça, vou rogar-lhe que tal não faça, quando não. Assinado: Januário Garcia.”
Imediatamente respondeu-lhe o outro:
“Primo, amigo e senhor. É verdade que queremos arrasar às casas da praça, por isso vou rogar-lhe que não se intrometa nisso, quando não. Assinado: Matheus Luiz.”
Januário Garcia, ou temer-se do primo, ou para não perder-lhe a amizade por tão pouco, ficou-se na ameaça vaga e indefinida do “quando não”; outro tanto, porém aconteceu com Matheus Luiz e o seu companheiro de pleito, pois na noite aprazada apresentaram-se ambos à frente de mais de cem cativos com carros de boi e instrumentos de demolição e puseram por obra a ameaça.
Não contentes de arrasarem às casas, mandaram carrear todo o material e despeja-lo a uma légua distante, ficando ambos os capitães mores de pé no lugar dos destroços com um troço de negros armados de foice até o amanhecer do dia, bradando ambos com todas `as forças dos pulmões:
Haja quem se oponha?!
Despertos os moradores por tais brados e vendo o arrasamento praticado durante à noite, tomaram o partido de se deixarem ficar trancados até os dois mandões se retirarem. Tentaram mais tarde alguns dos prejudicados processar os demolidores, mas a primeira ameaça dos capitães mores de mandá-los surrar, retiraram as suas queixas e a praça ficou desde então livre de novas invasões.”

O município de Lavras teve um grande desenvolvimento na década compreendida entre os anos de 1907 e 1917, quando os lavrenses investiram na cidade, promovendo melhorias de grande expressão para a época. Em 21 de outubro de 1911 foi inaugurada a linha de bonde na cidade, por iniciativa do Dr. Álvaro Augusto de Andrade Botelho, um grande passo no progresso do município. Acredita-se, então, que Lavras se desenvolveu em conseqüência da agricultura e não da mineração, como afirmava o professor Firmino Costa.
No final da década de 1910, o povo de Lavras viu, pela primeira vez, um automóvel; daí para frente, o progresso se acelerou. Assim, falando de perto aos corações daqueles que realmente amam esta cidade de Lavras, primitivamente denominada Campos de Santana das Lavras do Funil. O lavrense Sr. Paulo Oliveira Alves escreveu o seguinte poema, no ano de 1968:


                      NASCEU LAVRAS

   Cavalgando este espigão em busca d’ouro,
   Certo dia, por aqui alguém parou.
   Uma aldeia mui pequena foi surgindo,
   Foi crescendo e grande urbe se tornou.

   Sacrifício, sol ardente, escravatura
   Com bateia, ferramenta e animais;
   Muitos botes Rio Grande navegando,
   À procura do mais nobre dos metais.

   E o cadinho foi fervendo... fervilhando,
   Apurando mente, alma, coração.
   E o lavrense trabalhando, construindo,
   Fez de Lavras, um primor, nesta nação.
   Vamos gente! Caminhar para o futuro
   Com nobreza, com vontade de vencer!
   Esquecendo velhas faltas que destroem,
   Grande chance, sempre temos, pra crescer................

Fonte: (*) SILVA, A.T.: Evolução Histórico-Cultural e Paisagística das Praças Dr. Augusto Silva e Leonardo Venerando , Lavras, MG. 2006. 238p. Tese (Doutorado), Universidade Federal de Lavras/UFLA; Informações pessoais do historiador Eduardo Cicarelli.

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